EX-COROINHA QUE DENUNCIOU PADRE POR ABUSO EM GUARUJÁ SERÁ OUVIDO PELA JUSTIÇA NO LITORAL DE SP.
- Guaruja milgrau
- 29 de out.
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Dez anos após o início da luta por reconhecimento judicial, o ex-coroinha Lucas Grudzien, de 28 anos, será finalmente ouvido no processo cível que move contra o padre Edson Felipe Monteiro Gonzalez, da Paróquia Senhor Bom Jesus e da Mitra Diocesana de Santos, em Guarujá, no litoral de São Paulo.
Em decisão de 13 de outubro deste ano, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) determinou que Lucas e o padre prestem depoimento e que sejam produzidas novas provas técnicas e documentais sobre o caso, ocorrido entre 2012 e 2013, quando Lucas era coroinha e tinha 15 anos.
A decisão reverteu parte de um despacho da 2ª Vara Cível de Guarujá, que havia negado pedidos de prova da defesa de Lucas. O relator do acórdão, desembargador Antônio Mário de Castro Figliolia, ressaltou que o caso “tem óbvia repercussão social” e que a instrução “deve ser particularmente minudente”, determinando inclusive a apresentação, pela Igreja, do processo canônico em que o padre foi julgado internamente e condenado pelo Vaticano.
O documento deve ser entregue em cinco dias, sob pena de busca e apreensão com apoio policial e possíveis medidas criminais caso a ordem não seja cumprida. Também foi autorizada a perícia psicológica de Lucas e do sacerdote, além da ampliação do número de testemunhas — agora até três por fato, com limite de dez.
“Essa decisão me dá esperança”
Em entrevista para A Tribuna, Lucas afirmou que recebeu a decisão com alívio e esperança. “Foram muitos anos esperando que a Justiça reconhecesse a importância de esclarecer os fatos com profundidade. Essa nova decisão me dá esperança, porque determina que provas fundamentais e depoimentos finalmente sejam apresentados”, disse.
Ele lembrou que o caso começou em 2012, quando atuava como coroinha e auxiliar na Paróquia Senhor Bom Jesus, na Vila Zilda, em Guarujá. “Eu tinha 15 anos e o padre, com uma diferença de idade e hierarquia, conseguiu abusar de mim durante muito tempo. Mantínhamos relações sexuais sempre escondidas, e eu não compreendia o que estava acontecendo. Era um adolescente com o sonho de ser padre”, contou.
Lucas, que hoje atua como líder de logística, afirma que o processo foi um caminho muito difícil. “Faz tempo que esse processo está rolando. Foram dez anos entre o inquérito criminal e o cível. A decisão do TJ é um sinal de que a verdade ainda pode vir à tona. Eu acredito que visibilidade e transparência são fundamentais para evitar que outras pessoas passem pelo mesmo que eu passei”.
Defesa fala em avanço da Justiça
Em nota à imprensa, as advogadas Andressa Fraga e Dilene de Jesus Miranda, que representam Lucas, afirmam que o TJ-SP tem garantido “a plena apuração dos fatos, evitando que o processo siga de forma capenga” — expressão usada pelo próprio colegiado ao reformar a decisão de primeira instância.
Elas destacam que o tribunal impôs à Igreja a obrigação de apresentar integralmente o processo canônico, “no qual o sacerdote foi condenado”, e que, caso o documento não seja entregue espontaneamente, “foi autorizada sua busca e apreensão com força policial”.
A defesa também ressalta a importância da oitiva da vítima e do sacerdote, da perícia psicológica de ambos e da ampliação do rol de testemunhas, afirmando que “passados mais de 13 anos dos fatos, Lucas e sua família ainda convivem com os reflexos emocionais e psicológicos decorrentes do episódio”.
Histórico do caso
O inquérito criminal foi instaurado em 2013, mas arquivado em 2018, sem denúncia, sob o argumento de que não houve estupro de vulnerável, já que Lucas tinha 15 anos na época dos fatos.
Paralelamente, a Diocese de Santos abriu um processo canônico em 2016 e afastou o padre do exercício público do ministério sacerdotal por cinco anos, após investigação da Congregação para a Doutrina da Fé, em Roma.
Com o arquivamento da esfera criminal, Lucas ingressou com a ação cível de indenização por danos morais em 2020, pedindo reparação e reconhecimento dos abusos. Desde então, a defesa vinha enfrentando dificuldades para produzir provas no processo.
Posicionamento da Diocese de Santos
A Diocese de Santos informou, em nota da Mitra Diocesana, que é a sua representante legal, que o padre Edson Felipe Monteiro Gonzalez pode exercer o ministério presbiteral e que o advogado que o representa é da Cúria Diocesana.
“Atualmente, o sacerdote colabora com atividades pastorais junto à Cúria Diocesana, sem estar provisionado para alguma paróquia específica. No âmbito civil, esclarecemos que o processo a que o presbítero está submetido segue em trâmite, sob segredo de justiça, ainda na fase probatória, sem decisão de mérito até o momento”.





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